16 de Setembro de 2024

Doença de Alzheimer: InsCer avança na direção certa

Neurologista e pesquisador Tharick Pascoal falou sobre rumos de pesquisas atuais e diferenciais do Instituto do Cérebro.

Da esquerda para a direita: Cristiano Aguzzoli, Jaderson Costa da Costa, Tharick Pascoal e Lucas Schilling.

“Acredito que estamos vivendo um momento mágico da doença de Alzheimer, e o InsCer faz parte disso”, afirma o neurologista Tharick Pascoal. Em breve visita ao Instituto do Cérebro, o pesquisador e professor associado da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh (EUA), falou sobre o potencial para novos tratamentos, rumos das pesquisas atuais e os diferenciais do InsCer. Confira abaixo!

Quando falamos de estudos sobre demência, o que podemos afirmar sobre o que está sendo realizado, sobretudo nas populações brasileira e latino-americana?


Acredito que tivemos muitos avanços nas pesquisas, em termos de biomarcadores e de tratamento, mas o que se percebeu foi que boa parte dos estudos não considera latinos, negros e populações de outras localidades. E novos estudos revelaram a diferença em termos de biomarcadores, o que resulta na diferença de dose de tratamento. Logo, tornou-se um consenso – por parte das companhias farmacêuticas, do National Institute on Aging (NIA), entre outras autoridades – sobre ser necessário replicar resultados desses estudos em populações locais, como a brasileira, para se obter resultados mais precisos quando falamos em Alzheimer. Nos Estados Unidos, por exemplo, se pode ter acesso à população latina, mas não se sabe se os dados coletados consideram fatores genéticos ou locais. Logo, estudar latino-americanos na América Latina te oferece a possibilidade de fazer isso e de diferenciar esses fatores.

E para além da questão local, quais os principais obstáculos para o avanço dessas pesquisas, hoje?

Na América Latina, é a falta de estrutura – sendo o InsCer exceção. A falta de lugares minimamente parecidos com o Instituto do Cérebro, seja no Brasil ou na América Latina, faz com que aqui seja um local único, porque consegue combinar o acesso à população latino-americana e a tecnologia avançada que é necessária para conduzir esses estudos. Aliás, há um ou dois centros no mundo que oferecem isso – na África, por exemplo, não tem nenhum – e, no Brasil, é o InsCer, por isso ele é tão importante. Acredito que o Instituto será responsável por gerar dados para o mundo todo, fornecendo informações que faltam para o quebra-cabeça do Alzheimer, por ter essa combinação única.

A neuroinflamação desempenha um papel importante na doença de Alzheimer, como mostram estudos realizados no seu laboratório. Quais perguntas relacionadas à neuroinflamação que a ciência ainda não consegue responder?

O campo de pesquisas relacionadas ao Alzheimer começou dando muita ênfase para as proteínas amilóide e tau, que estão entre as causas da doença, mas não têm a capacidade de explicar, sozinhas, o Alzheimer em si. Para a doença progredir, o cérebro deve estar inflamado, e isso torna os fatores genético e ambiental ainda mais importantes, pois hoje sabemos que a poluição ou mesmo a água local podem contribuir para a inflamação. Os biomarcadores que detectam o nível de inflamação no cérebro serão bons preditores para saber se a doença irá progredir ou não. Por isso, o próximo passo para obter mais respostas sobre o Alzheimer passa, necessariamente, pelos biomarcadores de inflamação, algo que também faz parte do trabalho realizado aqui no InsCer, liderado pelo dr. Cristiano Aguzzoli. A pesquisa dele faz o link entre inflamação e sintomas neuropsiquiátricos nos pacientes, como agito e agressividade, e que afetam bastante os cuidadores de pessoas com Alzheimer. Isso tudo abre um leque para estudarmos novas possibilidades de medicações.

Podemos ter esperanças pra novos tratamentos, ou até mesmo cura do Alzheimer? Acredito que estamos vivendo um momento mágico da doença de Alzheimer, uma fase incrível, e o InsCer faz parte disso. Pela primeira vez, conseguimos fazer a doença progredir um pouco mais devagar: 25% mais lenta. No entanto, isso significa que ainda temos os outros 75%, ou seja, mesmo tendo avançado, ainda temos muita coisa para fazer e, em termos de cura, acredito que há muitos anos pela frente. Mesmo assim, acredito que, assim como o câncer, a terapia que vai nos dar a cura não seja uma terapia, mas uma combinação de terapia que terá um resultado melhor para os pacientes. A visão do insCer em fazer as coisas tem muito a ver com uma expressão do hockey canadense, que é correr para onde a bolinha vai estar, e não onde ela está. Tudo o que está sendo feito aqui gira em torno disso, e acredito que será fundamental para um tratamento efetivo para a doença de Alzheimer.

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Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Tharick Pascoal realizou residência em Neurologia na PUCRS. Possui pós-doutorado em neurociências pela Universidade McGill (Canadá), onde também realizou um fellowship em doenças neurodegenerativas. Atualmente, é professor associado da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh (EUA) e um dos pesquisadores mais renomados em Alzheimer e outras doenças degenerativas.